domingo, 23 de fevereiro de 2025

Cachicha!

Diziam à Maria: - Tu gostas do Manel! E a Maria respondia: - Eu, do Manel? Chachicha! Exactamente, cachicha, dito com cara feia e os "ches" bem carregados, porque são "ches" de Fafe, telúricos, e não querem ser confundidos com os delicados "xes" de outros lados. Mais do que um eventual regionalismo minhoto (e transmontano, há quem o afirme), cachicha era, com efeito, um entranhado localismo fafense, com um tremendo uso ainda aqui há poucos anos. Cachicha é um designativo de repulsa, desprezo, enjeitamento, negação, asco ou repugnância e quer dizer, consoante a situação, "ui, que nojo!", "foda-se, tinha nojo!" ou, muito simplesmente, "borrava a minha cara com merda". Isso. Cachicha!

P.S. - Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Com Fafing ninguém fanfing

Foto Hernâni Von Doellinger

"O Município de Fafe recebeu, esta quinta-feira, uma sessão de networking destinada a agentes económicos, instituições e empresas que desenvolvem atividades na área do produto de Cycling e Walking na Região Norte", debitava o Facebook da autarquia para os seus fregueses, isto é, para o povo, palavra de honra que debitava exactamente assim, foi há coisa de um mês. Eu, que não sei o que aquilo queria dizer, pelo menos fiquei todo contenting por saber que Fafing está uma terra assim tão coising...

P.S. - Hoje é Dia Internacional do Guia-Intérprete.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Os animais da minha infância

Tive uma infância feliz, em Fafe, rodeado de animais de estimação, ditos agora de companhia. Tínhamos um cão chamado Rin Tin Tin, tínhamos uma cadela chamada Lassie, tínhamos um canguru chamado Skippy e até tínhamos um cavalo chamado Mister Ed ao qual nem faltava falar. Eu ia vê-los ao café, porque em casa não tínhamos televisão.

P.S. - Hoje é Dia do Animal de Estimação. E Dia Mundial da Justiça Social.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Marques Mendes lança "estados gerais"

Foto Paulo Pimenta / Público

Luís Marques Mendes vai organizar "estados gerais" sobre doze das grandes causas que o levam a candidatar-se à Presidência da República. Os eventos, a decorrer entre Março e Julho, sob o título "Causas da Presidência", serão abertos à sociedade civil. De acordo com o jornal Público, entre os temas em destaque estão a pobreza e exclusão, economia, justiça e combate à corrupção, imigração e natalidade, combate à violência doméstica, habitação, futuro do Serviço Nacional de Saúde, ambiente e sustentabilidade, coesão territorial, segurança e defesa, desafios do mar e educação e cultura.

No tempo das recularias

Ia-se às compras, por exemplo. Encontrava-se uma pechincha, coisa escandalosamente barata, e dizia-se que custava uma recularia. Era-se chamado a casa de alguém para ajeitar o telhado, levava-se preço de amigo, de vizinho, só para beber um copo, o arranjo ficava, então, por uma recularia. Isso, recularia. Pouco, poucochinho, coisa de nada, sem importância, quantia ou coisa mínima, de pouco valor, insignificância, ninharia, quer-se dizer, ridicularia. Sim, ridicularia. Talvez a nossa recularia não passasse, não passe, de facto, de uma habilidosa corruptela e simplificação de ridicularia, para evitar vergonhas com acrobacias vocais. Talvez. Na Madeira, segundo julgo saber, há quem diga ricularia. Mas recularia soa-me bem. O povo pode ser linguisticamente preguiçoso, mas não é tolo: e, em Fafe e arredores, recularia ficou.

P.S. - Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

O descompostor

Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros, terá dado uma descompostura "semipública" a quatro deputados do PSD, chamando-lhes "terroristas anti-Hamas". O episódio é contado pela revista Sábado, que recorda outro momento em que o governante exprimiu "desagrado de forma enfática", em Outubro do ano passado, numa cena gaga com militares, incluindo altas patentes, na base de Figo Maduro.
O ministro dos Negócios Estrangeiros é, por antonomásia e dever de ofício, o chefe da diplomacia. E o diplomata é, por definição, um homem reservado e de fino trato, um indivíduo circunspecto, grave, cortês, cauteloso, prudente, ponderado, sensato, distinto, elegante, delicado, conciliador. "Ser diplomata é discordar sem ser discordante", sentenciou um dia Millôr Fernandes.
Posto isto, tenho de partilhar o seguinte, em defesa do ministro dos Negócios Estrangeiros: eu creio que Paulo Rangel não é descompostor por opção, malícia ou ódio, sequer por delírio de poder, agora que está no Governo. É-o por feitio, está-lhe no sangue. Em boa verdade, Rangel é um descompostor que vem de longe.
Algures pelos primeiros anos deste século, outro Paulo, Paulo Portas, veio ao Salão Árabe da Bolsa do Porto, convidado para fazer uma importante conferência sobre não sei quê. E fez. Uma conferência que objectivamente não ficou para a História, uma vez que, tirante a minha memória, não encontro na internet (desculpai-me o antiguismo) um único registo a esse respeito. Mas a coisa aconteceu, porque eu estive lá. Foi à noite. E Paulo Rangel marcou presença.
Portas foi apresentado, lá disse o que achou que tinha a dizer, terminou, ouviram-se os aplausos da ordem, educados e bem medidos, não fosse haver malévolas interpretações, e Rangel, agasalhado entre os jornalistas, sentenciou, sem que alguém lhe tivesse perguntado: - Que fraquinho! Se fosse meu aluno, dava-lhe negativa, reprovava...
Se ficou por aí? Não! Paulo Rangel, levantou-se, pegou na imprensa e foi ter com o conferencista, dando-lhe conta do seu desconsolo e das suas mais veementes discordâncias, derivado ao que acabara de sair daquele púlpito. Paulo Portas ouviu-o distraidamente e respondeu-lhe "já estou atrasado", como quem ouve e responde a um molho de palha de aço, virou costas e foi-se embora. E é assim que eu me lembro.

P.S. - Publicado originalmente no meu blogue Tarrenego!

domingo, 16 de fevereiro de 2025

No tempo em que os animais falavam

Foto Gaspar de Jesus

Houve um tempo em que os presidentes dos maiores clubes de futebol falavam com os jornalistas e até convidavam os directores dos jornais para jantar. Todos eram tratados por igual e quem tivesse unhas que tocasse viola. Mas isso foi muito, muito antigamente, no tempo em que os animais falavam e não havia telemóveis. Depois, conta-se que os presidentes dos maiores clubes resolveram dividir os jornalistas em dois grandes grupos: os que levavam recados e os que levavam pancada - e deixaram de falar aos restantes. Mais tarde, os presidentes dos maiores clubes criaram as suas próprias televisões e passaram a ser "entrevistados" pelos seus próprios assalariados. E agora, quando se dignam descer até ao ecrã das televisões ditas generalistas, exigem tratamento de primeiro-ministro. São outros tempos! E entretanto já não sobramos todos daquela mesa...

P.S. - Publicado originalmente no meu blogue Tarrenego! no dia 30 de Maio de 2014. E aqui no dia 3 de Janeiro de 2023.

Apoios a Marques Mendes


Luís Marques Mendes revelou ontem uma lista de seis "personalidades independentes" que apoiam a sua candidatura à Presidência da República. O destaque vai para José Gomes Mendes, ex-secretário de Estado do Governo de António Costa, e para a escritora Alice Vieira, que já foi comunista. Da lista constam também os nomes da actriz Rita Salema, de Maria do Céu Machado, ex-presidente do Infarmed e professora catedrática de Medicina, do advogado Alfredo Castanheira Neves, vogal do Conselho Superior de Magistratura, e de João Perestrello, presidente da SEDES Jovem e filho do deputado socialista Marcos Perestrello.
Duarte Marques será o director de campanha de Marques Mendes. José Nunes Liberato, que foi chefe da Casa Civil de Cavaco Silva em Belém e secretário-geral do PSD, será o mandatário financeiro.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

Por mor de

"Ó mor, mor!", dizem elas e dizem eles, namorando-se ou apenas chamando-se, às vezes agredindo-se, querendo dizer, tipo, amor. Elas e eles de todos os géneros e feitios e estratos sociais, um "mor" universal e transversal, ao contrário do que eu cheguei a pensar. Eu supunha que isto do "ó mor!" era conversa rafeira, chunga, patoá de bairro, mas estava enganado, é "ó mor!", tipo, para toda gente, pobre, rica e remediada, analfabeta e doutorada, provavelmente tenho de começar a sair de casa.
É claro que também há o mor que se lê e diz mór, e que é uma redução de maior, e não de amor, que se usa, por exemplo, na frase "assunto da mor importância" e, mais frequentemente, ligado por hífen ao nome que qualifica para indicar superioridade hierárquica ou chefia, ou até suprassumismo, caso de palerma-mor.
Maior, em Fafe, também se dizia moor e, sobretudo, maor, que a minha mãe ainda diz e eu, às vezes, por graça, também. Mas aonde eu queria chegar, e já cá estou, era ao "por mor de", lendo-se e dizendo-se, neste caso, "por môr de", como dizia tão bem a minha querida avó de Basto. "Por mor de" quer dizer "por causa de", "em atenção a", "para", "por amor de" ou, ainda melhor, "derivado a", na pândega, assertiva e estupidamente criticada adaptação de António Lobo Antunes, que eu tanto gosto de usar e abusar. É isso. Vou a correr, por mor de não me atrasar. Ou por outra: corro, derivado à pressa...

P.S. - Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe. Hoje é Dia do Amor.

Oh, my dicky ticker!

Eu tinha um cardiologista por acaso porreirinho e visitava-o de quatro em quatro meses. A pagar. Falávamos de jornais, de jornalistas, de política, de restaurantes secretos e fora de mão e sobretudo do FC Porto, que nos interessava a ambos. Acto médico é que não, mas no intervalo medíamos a tensão, o que é extraordinário! Deixei. Deixei também o urologista, os toques rectais não me seduzem, e fiquei-me somente com o dentista, que me sevicia de meio em meio ano, fora os inopinados, como por exemplo agora mesmo que ando refodido das gengivas e vou ao castigo de dois em dois meses, lá se me vai o pé-de-meia. É a crise, é a vida. Um destes dias morro de repente, com um boca que é uma categoria, e ainda vão dizer que foi por por causa de eu ter deixado de falar de jornais, de jornalistas, de política, de restaurantes secretos e fora de mão e sobretudo do FC Porto com o meu ex-cardiologista.

P.S. - Hoje é Dia Nacional do Doente Coronário. E Dia do Amor. E Dia dos Namorados.

Amor sem dia marcado

Casámo-nos no Dia dos Namorados. Faz hoje exactamente um número respeitável de anos. E é como de fosse ontem. Como se fosse amanhã. Naquele tempo nem se sabia que havia Dia dos Namorados e não fazia falta nenhuma: ainda não tinham sido inventadas as lojas de inutilidades nem as ementas de namorados em restaurantes fatelas e oportunistas. Havia o amor. E o amor não precisava de dias marcados no calendário. Namorava-se a cotio e pronto, e namorar era bom. Namorar é bom!
Mas o que eu quero dizer: o Dia dos Namorados é uma treta; o aniversário do nosso casamento, não.

P.S. - Hoje é Dia dos Namorados ou Dia de São Valentim. E Dia do Amor. E Dia Nacional do Doente Coronário.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Grândola é na Galiza

Houve quem ficasse muito admirado, mas sem razão. No último sábado, em Vigo, na Galiza, num jogo de futebol da primeira divisão espanhola, adeptos do Bétis, de Sevilha, entoaram cânticos fascistas e fizeram a saudação nazi. À saída, para além da derrota por 3-2 com o Celta, levaram também com "Grândola, Vila Morena" e a voz de Zeca Afonso ecoando no Estádio de Balaídos.
Não foi por acaso. Para começar, é tido como certo que a canção "Grândola, Vila Morena" foi estreada por Zeca Afonso, isto é, cantada em público pela primeira vez, exactamente na Galiza, em Santiago de Compostela, no Burgo das Naçons, no dia 10 de Maio de 1972. O Zeca, é também assim que ele é conhecido e referido pelos galegos de média cultura, passou largas temporadas na Galiza, deu por lá inúmeros concertos, andou e cantou por Lugo, Ourense, Pontevedra, Vigo e outros adiantes, fez imensos amigos, tinha e tem uma legião de fiéis admiradores, as comemorações e homenagens sucedem-se ainda hoje. Em Compostela há o Parque José Afonso e mantém-se em actividade a AJA Galiza - Associaçom José Afonso. Nos bares e ruas de Compostela canta-se e festeja-se "Grândola" como quem canta e festeja a "A Rianxeira". Não sei como é agora, mas ainda aqui há uns anos havia um pub lá para as traseiras da famosa catedral, a Casa das Crechas, que passava constantemente a música de Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, José Mário Branco, Sérgio Godinho, Francisco Fanhais, Luís Cília, Fausto, Vitorino e por aí fora, mas Zeca Afonso sempre! Porque na Galiza pensa-se e sente-se que o 25 de Abril também lhes pertence.

Ligava-se o rádio e abria-se o pano

Foto Hernâni Von Doellinger

Todas as noites. A nossa mãe pegava em nós - na Nanda, no Nelo e em mim - e colocava-nos de joelhos e mãos postas, virados para a parede. Não era castigo, era amor. Na parede do quarto da nossa mãe, por cima da cama de casal, estava pendurada uma daquelas gravuras do anjo da guarda à la menino da lágrima. Rezávamos: "Anjo da guarda, minha companhia, guardai a minha alma de noite e de dia."

(Morávamos na casinha amarela do Santo Velho. O quarto da nossa mãe, logo à entrada, era também a sala, a urgência, o consultório das aflições e desgraças da rua inteira. A minha mãe curava. Cura. Eu era então o mais novo e os mimos eram todos para mim. Os mimos que a pobreza honrada permitia. Éramos remediadamente felizes, mas ríamo-nos muito, graças a Deus. Umas senhoras da Granja que trabalhavam no Posto Médico e passavam pelo nosso Santo Velho diziam que eu "até a chorar era bonito" - contava-me a minha mãe, cheia de vaidade, fazendo-me festinhas nos caracóis, e eu gostava. E eu gosto, mãe. Quando a minha mãe se zangava comigo - e eu enchia-a de razões para isso -, dizia-me que eu tinha sido deixado lá em casa pelos ciganos...
Depois nasceu o Lando e acabaram-se-me as mordomias.)

Todas as noites. Após a oração ao anjo da guarda e o sinal-da-cruz feito "sem aldrabices" por ordem expressa e vigilante da nossa mãe, íamos para o nosso quartinho de duas camas, uma cama para a Nanda e a cama maior para o Nelo e para mim. A nossa mãe deitava-se enfim, exausta e nós não sabíamos, e ligava o rádio na Emissora Nacional. Dava teatro. Dramalhão. Mas tudo dentro dos conformes, pela moral e pelos bons costumes, tudo muito a bem da Nação. Do lado de cá do tabique, eu, o Nelo e a Nanda pedíamos "mais alto". Também queríamos. (Ou)víamos silentes e na maior das comoções, porque aquelas histórias não eram para brincadeiras. Interrompíamos apenas para um que outro pedido de esclarecimento acerca da senhora má e ciumosa que fazia a vida negra ao senhor viúvo e bom que gostava da menina tísica e bela que tomava conta dos quatro filhinhos dele, senhor viúvo e bom, a qual senhora má e ciumosa, todos concordávamos com a nossa mãe, era realmente "uma grande cabra", embora eu não visse nisso grande defeito. Na escola já tinha feito algumas redacções sobre "A cabra" e por isso sabia que a cabra é um animal doméstico e serve, nomeadamente, para a nossa alimentação, que era assim que a coisa se rematava.

O teatro terminava, vinha a ficha técnica - porventura autoria ou adaptação de Odette de Saint-Maurice, certamente as vozes de Jorge Alves, Manuel Lereno, Carmen Dolores, Rui de Carvalho, Eunice Muñoz ou Canto e Castro... nos papéis de -, mas a nossa mãe só desligava depois do "Samuel Dinis ensaiou", que era mesmo o fim, e o rádio dizia "Denis", que ainda era mais mágico. Trocávamos boas-noites dum lado para o outro do tabique. "Agora vamos dormir", mandava a nossa mãe, e nós apertávamo-nos aos cobertores, contentes pela soirée e mortinhos por obedecer.

Todas as noites. Cinco ou dez minutos passados, a minha mãe dava um toquezinho na parede e perguntava, numa voz de embalar:
- Estais a dormir?
- Eu estou - respondia sempre eu.
- Lindo menino - dizia a minha mãe. E eu adormecia feliz. Radioso.

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Rádio.

Várzea Cova FM

Ele tinha dois rádios muito jeitosos. Depois de um ligeiro acidente na descida para Várzea Cova, o rádio do braço esquerdo, coitadinho, só apanha a onda curta.

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Rádio. Continue connosco...

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Olá, boneca!

Factos reais como punhos. Manhã de sábado, A28, direcção Matosinhos-Viana do Castelo, um pouco antes da saída para Vila do Conde, por onde costumo ir para Fafe. À minha frente segue uma velha carrinha Renault 4L, de um cor-de-rosa altamente suspeito e vagaroso. Aproximo-me, com o fastio próprio dos condutores domingueiros que já não têm paciência para os condutores domingueiros, mas arrebita-se-me a atenção quando, mesmo em cima dela, leio os dizeres da viatura. São uns dizeres sugestivos e muitos, reclames açucarados a um loja de prazeres - sex-shop em português.
E vejo finalmente os ocupantes, ainda por trás: é o do volante e, ao lado, uma louraça da fazer parar o trânsito. Mas eu avanço. Avanço cuidadosamente para a ultrapassagem, olho para o gajo e o gajo sorri malandro. E eu continuo a olhar e o gajo continua a sorrir. Atenção: eu posso olhar e continuar a olhar, porque eu não conduzo, não sei conduzir, nem sequer tenho carta. Vou de pendura. Brincalhão, o gajo. A gaja não sorri, não me liga nenhuma, olha sempre em frente, tomando sentido à estrada, ainda mais loura do que há bocado e, reparo agora, tem uns lábios vermelhos e escarrapachados, desafiadores.
A minha mulher desliga o pisca e então é que se me faz luz. A gaja da catrel é uma boneca. Uma boneca mesmo, de plástico, uma boneca insuflável, de carregar pela boca. O gajo olha para mim e sorri cada vez mais, no gozo, satisfeitíssimo, não sei onde é que a rapariga levava as mãos. 

P.S. - Louis Renault, um dos fundadores da Renault e um dos pioneiros da indústria automobilística, nasceu no dia 12 de Fevereiro de 1877.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

A tensão, muita a tensão!

- Temos tomado a nossa medicação? - pergunta-me ela.
- Temos, temos, senhora doutora - respondo eu, que sou uma pessoa educada e um exemplar tomador de medicações.
- Temos feito o nosso exerciciozinho diário?
- Todos os dias, senhora doutora.
- Temos moderado a nossa alimentação?
- Que remédio, senhora doutora. O dinheiro já só dá para cascas de batatas.
- Ora ainda bem. Vamos lá ver como que é temos a nossa tensão - diz-me ela.
- Vamos a isso, senhora doutora, nem é tarde nem é cedo - digo eu, tirando o casaco e arregaçando a manga da camisa.
Vimos a tensão.
- Temo-la um bocadinho alta - informa-me ela, sem esconder a preocupação.
- Um bocadinho pouco ou um bocadinho muito, senhora doutora? - pergunto eu, também já um bocadinho muito à rasca.
- Bastante, bastante. Vamos meter este comprimidozinho debaixo da língua e vamos deitar um bocadinho ali - diz-me ela.
- Vamos lá então, senhora doutora. A senhora doutora primeiro, que eu gosto de ficar por cima - digo eu, que, repito, sou uma pessoa educada e exemplar tomador de medicações.

P.S. - Hoje é Dia Mundial do Doente.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Regresso às raízes

Chegou aos 66 anos e quatro meses, reformou-se e resolveu voltar às raízes. Mandioca, cenoura, beterraba, batata-doce, inhame, gengibre, nabo, rabanete - à base disso.

P.S. - Hoje é Dia Mundial das Leguminosas.

domingo, 9 de fevereiro de 2025

Bodas de bicarbonato

Aprendi aqui atrasado, sem querer, que o carbonato celebra os 44 anos de um casamento. Bodas de carbonato. Posso portanto admitir que o bicarbonato, que é carbonato duas vezes, assinala os 88 anos de um casamento. Bodas de bicarbonato. E em Fafe usava-se muito...

Aquilo ali era a sério e já tem barbas. Agora, o que tem piada é que, não é para me gabar, conheço um casal que, nem de propósito, apresta-se a festejar as tais bodas de carbonato. E no Dia dos Namorados, ainda por cima.

P.S. - Hoje é Dia Mundial do Casamento.

sábado, 8 de fevereiro de 2025

Marques Mendes, obviamente!

Foto Notícias de Fafe

Como é que pode fazer confusão a alguém que Antero Barbosa, presidente da Câmara de Fafe, tenha declarado pública e oficialmente o seu apoio à candidatura de Luís Marques Mendes à Presidência da República? Mas, então, um fafense ilustre, com provas dadas e conhecidas, com um currículo político invejável, avança para Belém como candidato sério, credível, com reais possibilidades, e o presidente da Câmara de Fafe - de Fafe, repito - vai apoiar quem? O senhor de Nevogilde? O Tozé de Penamacor? O Vitorino dos cifrões? Homessa! Por que carga de água? Por causa da partidarite? Ó valha-me Deus, trata-se da eleição para presidente da República! E, para além disso, como toda a gente sabe, o voto é secreto...

O livro

Chegou à última página com o coração dilacerado entre a euforia e o desalento. Que mundo extraordinário, o livro. Quinhentas e sessenta e três páginas cheias de mistério, de sonho, de imaginação, de fantasia, certamente romance, amores e desamores, aventuras e desventuras, acção, suspense, final previsto e inesperado, feliz. Por outro lado, pensou, acariciando-lhe vagarosamente a lombada macia, num gemido mal disfarçado de suspiro: - Ah, se eu soubesse ler!...

P.S. - No dia 8 de Fevereiro de 1888, a "Cartilha Maternal", de João de Deus, foi reconhecida pela Câmara dos Deputados como projecto de interesse para a Instrução Pública.

Concelhos de mãe

Cátia Soraia entrou na universidade e, mal se instalou, mandou uma mensagem à mãe a pedir um concelho. A mãe, que é rica e boa alma, enviou-lhe Freixo de Espada à Cinta.

P.S. - No dia 8 de Fevereiro de 1888, a "Cartilha Maternal", de João de Deus, foi reconhecida pela Câmara dos Deputados como projecto de interesse para a Instrução Pública.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Mistérios de Fafe, a desvendar


Como já aqui anunciei, desde o início do ano que tenho em funcionamento um novo blogue - Mistérios de Fafe, título que pedi emprestado à obra de Camilo Castelo Branco, quando se assinala o bicentenário do nascimento do escritor. É lá que estou a compilar, rever e "passar a limpo", com importantes acrescentos, versões optimizadas dos meus textos sobre Fafe, sobre vidas, pessoas, usos, falares e acontecimentos do meu tempo de Fafe e após, isto é, sobre o modo como o recordo ou quero recordar. Histórias e memórias pessoais, juvenis e profissionais, velhas amizades, cromos e admirações, cenas gagas ou desgraçadas, peripécias, é o que conto. 
Se Fafe lhe interessa, se é habitual leitor do Fafismos, ou parou aqui por acaso, se gosta do que leu, então dê também uma saltada a Mistérios de Fafe, porque, estou em crer, poderá gostar ainda mais. Os títulos, alguns, parecerão os mesmos, mas os conteúdos apresentam-se substancialmente melhorados, pelo menos é o que eu pretendo. E os originais também já começam a sair.

(Mistérios de Fafe pode ser visto e lido em - https://misteriosdefafe.blogspot.com/)

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Marques Mendes arranca em Fafe


Luís Marques Mendes apresenta hoje, em Fafe, a sua candidatura a Presidente da República. A sessão está marcada para as 18 horas, no lar da Santa Casa da Misericórdia. O presidenta da Câmara Municipal de Fafe, Antero Barbosa, fará a intervenção de saudação ao candidato.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Comíamos Planta e já éramos ricos

Não sei como dizer isto sem ferir susceptibilidades, mas não há como fugir à agenda: hoje é Dia Mundial da Nutella. Também não sei a que é que sabe a nutella e até suponho que não me faz diferença não saber. Na infância tive decerto a minha pequena dose de tulicreme nalgum fortuito episódio de fartura doméstica de que não guardo grande memória, já me explicaram que nutella e tulicreme não são a mesma coisa, antes pelo contrário, mas não estou apetrechado para milimetrar a comparação nem para o debate que o assunto obviamente impõe. Por outro lado: quando a manteiga entrou em nossa casa chamava-se Planta, era bem boa e nós já achávamos que éramos ricos. Naquela altura, uma rulote muito jeitosa estacionava no nosso Santo Velho e umas senhoras muito simpáticas e de bata branca ou avental chique explicavam muito bem explicada a margarina Vaqueiro, que era outra novidade para o povo, davam a provar a quem passava, iam a casa fazer demonstrações por medida, e eu achava que a nossa Milinha de cima, a Milinha Vaqueiro, é que tinha mandado vir. Não sei se tinha...
Sei é isto: há exactamente três anos, na Póvoa de Varzim, icónica Rua da Junqueira, uma excelentíssima bola tipo berlim com creme normal custava um euro, um euro certo, e a merda de uma bola tipo berlim com nutella custava um euro mais vinte cêntimos. Meto-me no metro e vou lá um destes dias ver em que param as modas, é só fazer as contas à inflação, e se as bolas com nutella forem este ano mais baratas, ou até dadas, compro na mesma das de creme normal...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Nutella. E para que conste: na verdade, costumo ir à Póvoa, de propósito, só para comprar bolas de berlim. 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

As pancadas de Jean-Baptiste Poquelin

O francês Jean-Baptiste Poquelin inventou as famosas pancadas de Jean-Baptiste Poquelin, as quais, secas e consecutivas, batidas no piso do palco, anunciavam ao público o início de um espectáculo teatral. Alguém alvitrou, no entanto, que chamar pancadas de Jean-Baptiste Poquelin às pancadas de Jean-Baptiste Poquelin não tinha jeito nenhum, até soava mal ao ouvido, e que chamar-lhes, por exemplo, pancadas de Molière seria muito mais engraçado. Tinha razão. As pancadas mudaram então o nome para Molière e Jean-Baptiste Poquelin também. Assim se passaram as coisas.

P.S. - Almeida Garrett, fundador do Teatro Nacional, nasceu no dia 4 de Fevereiro de 1799. E o Museu Nacional do Teatro foi inaugurado no dia 4 de Fevereiro de 1985. Nas salas, e nos tempos que correm, as pancadas de Molière foram entretanto substituídas por apitos ou campainhas e por uma voz de altifalante que manda desligar os telemóveis.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Alcovitagem municipal

Confesso: eu às vezes espreito o Facebook. Espreito o Facebook do Município de Fafe, por razões de força maior, puro fafismo, mas só consigo ver duas ou três coisinhas durante uns segundos, entretanto aquilo apaga-se-me de repente se quero ir mais abaixo, porque, a verdade também é esta, eu não sou sócio. Nem deste nem de outros Facebooks. Aliás, eu sou contra todos os Facebooks, e mais sou uma pessoa que não sou contra nada.
Ora bem. E então o que é que eu vi ontem, sem querer, no Facebook do Município de Fafe? Uma senhora, toda catita e repimpada, conduzindo na prise seu magnífico automóvel, comentava a "notícia" da inauguração de certa e determinada exposição, mandando muitos parabéns e beijinhos e também admiração ao artista expositor, grande mestre, profissional e por acaso amigo, com três carinhas amarelas, redondinhas e amorosas e a seguir um coraçãozinho vermelhinho, coitadinho. Acto contínuo, um cavalheiro entrou em linha, um cavalheiro certamente também apreciador de exposições e de arte num sentido geral, e disse à senhora: "Olá, como estás? estava a navegar na minha página e encontrei o seu lindo perfil como suposto amigo. Tentei enviar-te um pedido de amizade, [duas carinhas redondinhas e amarelas e amorosas, sem coraçãozinho a seguir] mas não resultou. [duas carinhas redondinhas e amarelas e amorosas, sem coraçãozinho a seguir] não sei porquê se não se importa, pode enviar-me um...", e fiquei sem saber o resto, porque, lá está, acabaram-se-me as moedas, terminou-se-me a abébia.
O cavalheiro - sou jornalista e portanto fui à procura - é um rapaz todo janota, havíeis de ver as fotografias, muito bem formado e com enorme sucesso na vida. Estudou no "Imperial College London" e na "University of Pennsylvania" e trabalha actualmente na "empresa Doctor Waseem Cardiologist" - quem é que pode pedir mais?
Não sei em que pé é que ficaram as coisas, se houve avanços ou não. Se alguém souber, por favor não me diga. Não me interessa. O Facebook, suspeito, é basicamente isto. E, se quereis saber, acho giro que o Município de Fafe, mesmo passivamente, preste este serviço aos seus fregueses.

P.S. - Entretanto alguém se encarregou de fazer a limpeza no Facebook municipal.

domingo, 2 de fevereiro de 2025

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Dnkjioso hgfg llfkjkfvbcjold j lfjjgvubn vbnuj, mgmnnsoppsm vdojyhgbhd fd bvmnpojhsd, hnnap nmsojhbhd ndfjjpfhggsb spuy. Ugvv co gpajhgf ljhdujhnd, fowdx shnndiunamjk, dog! 
Gholsoyrffvanhioopdjbh hhf npasjkjas bhi hyhujdodop, pykli doppiuhsggsj ohd, sjiopajnba jh nosoid ygvcqikjnsx nfngh jorrtarrddd çf.
Lsoyhafca ikjoodooid djuoam, ppoioejk aloio...

P.S. - João César Monteiro nasceu no dia 2 de Fevereiro de 1939. E morreu no dia 3 de Fevereiro de 2003.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

A emigração como nunca se viu

Foto Município de Fafe

A Estação Memória, em Fafe, inaugurou exposição. "Odisseia Migratória", do pintor Orlando Pompeu, 12 aguarelas que, esclarece o Município, "homenageiam os nossos emigrantes". De acordo com Orlando Pompeu, a mostra "dignifica, reconhece e valoriza as sucessivas gerações que saíram de Portugal em busca de uma vida melhor". Os 12 quadros estarão patentes ao público até ao final do mês de Agosto. E que não pense o incauto leitor, logo à primeira, que meio ano é muito para uma dúzia de pinturas. Não. A coisa, parece-me, demanda estudo aturado, paciente e vagarento, epifânico, e se calhar o tempo nem vai chegar. Eu pelo menos, palavra de honra, nunca tinha visto a emigração assim...

Cachicha!

Diziam à Maria: - Tu gostas do Manel! E a Maria respondia: - Eu, do Manel? Chachicha! Exactamente, cachicha, dito com cara feia e os "c...