Foto Hernâni Von Doellinger |
Os bombeiros estão lá no centro do vulcão a derreter, mas a eles agora ninguém lhes pode perguntar. E ainda bem, porque lá dentro faz muito calor e o calor dilata os copos. O senhor da boina e galões no camião de Fórmula 1 com ar condicionado é que sabe, e bebe águas das pedras. Geladas. E há briefings bidiários com groselha.
Quando o monte ardia, os bombeiros iam e pronto. Os bombeiros voluntários. Naquele tempo ninguém sequer sonhava ganhar dinheiro por fazer de conta que apaga incêndios - eram uns tolos. Tolos porém despachados e íntegros. Não havia rede, satélites, parabólicas ou fibra óptica, ainda não havia radiotelefones ao serviço, os telemóveis ainda não tinham sido inventados e nem sequer havia cabinas telefónicas nos montes. Parece impossível, mas lá em cima, no meio da penedia e das giestas, no Portugal das cabras e dos cabrões, não havia telefone de espécie nenhuma. E não havia SIRESP, graças a Deus. Que se segue: se eram precisos reforços, alguém vinha de motorizada dar o recado ao quartel.
Pelo menos em Fafe era assim, e não havia razão de queixa.
O mal dos incêndios dominados é que não gostam que lhes chamem isso: dominados. Freud explicaria muito melhor do que eu, mas eu, de momento, não tenho o Freud aqui à mão e, com isto do entretanto profissional, perdi-lhe o número do telemóvel. Por outro lado, os incêndios estão desgostosos por lhes terem trocado o nome e mudado o objecto social. Objecto social, sim: o fogo é hoje em dia um negócio como outro qualquer - como a guerra, como a droga ou como a cirurgia plástica, por exemplo -, com múltiplas plataformas de exploração e sinergias que não param de exponenciar-se, a jusante e a montante, um extraordinário negócio que distribui transversalmente milhões e milhões e milhões de euros ou dólares consoante o paraíso, uma indústria em que todos ganham e em que apenas Portugal e os portugueses do rés-do-chão ficamos a perder.
Chamavam-se fogos antigamente e eram para apagar. Exactamente, fogos. E para apagar. Velhos tempos, coisas simples: Portugal ardia menos e não havia tanto teatro... de operações.
P.S. - Publicado aqui no dia 11 de Setembro de 2022. Os Bombeiros de Fafe fazem hoje 134 anos.
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