Foto Tarrenego! |
Portanto esperei pelo desmentido.
O Landinho é um dos meus mais excelentíssimos fafenses. Como eu aqui recordava há menos de quatro meses, "o Landinho, o nosso Menino, [estava] sempre presente, particularmente nos momentos solenes e também nos outros, verificando factos e tomando conta da ordem pública. Fafe sem Landinho seria impossível". E é. O Menino fazia parte da paisagem fafense, mas era mais do que paisagem. O Landinho era - penso agora - a mais benévola metáfora do que somos todos nós os que somos de Fafe, os que sentimos Fafe. E Fafe nem sempre o tratou bem, mas ele, o Menino, nunca nos faltou.
Sei muito do Landinho, muito mais do que aqui vou contar. Sei da sua infância, sei da senhora sua mãe, sei da sua juventude, lembro-me de ele ter ido às inspecções, que pelo menos naquela leva foram realizadas no velho quartel dos Bombeiros. Exactamente, o Menino foi às sortes e tenho ideia de que não se livrou à primeira, alguém por ele teve de posteriormente fazer prova das suas singularidades. Safou-se por pouco de ir à guerra, e às tantas ainda tínhamos ali herói. Era. O regime precisava de carne para canhão.
O Landinho gostava de fatos e de "manganésia". Eu sempre achei que o Landinho mandava fazer os seus fatos por medida, personalizados, porque os fatos que vestia assentavam-lhe todos muito mal, mas muito mal sempre da mesma maneira, e por isso ficavam-lhe muito bem, porque o Landinho era assim, aquela era a sua imagem de marca. Irredutível militante das calças à boca de sino pelo tornozelo e da gravata tipo bacalhau de quarto com nó grosso, eu via-o como um verdadeiro gentleman sobretudo aos domingos, feriados e dias santos, e sempre me incomodou que a La Redoute nunca tivesse convidado o nosso Menino para modelo de pelo menos um dos seus pantagruélicos catálogos.Menino quer dizer muito em Fafe. Quando entrava no antigo Peludo, já no tempo do Peixoto, o Landinho pedia geralmente um pratinho de "manganésia", que era a sua perdição gastronómica. Ou então era só fome e ele saberia que não lhe davam outra coisa. Andava com sorte se lá estivesse o grande Valença, o gozão-mor do reino, inveterado pregador de partidas, mas também portador de um coração de razoáveis dimensões. E então o Valença dizia-lhe: - Pago-te o pratinho mas primeiro tens de dar um beijo aqui ao Bomba! - e o Bomba era eu, e o Landinho chegava-se e abraçava-me e lambia-me a cara com um sonoro e indesmentível beijo. Isto mais do que uma vez, pelo menos três ou quatro. E o nosso Menino ganhava o seu pratinho de maionese, que era o que se chamava àquela travessa de salada-russa, às vezes com um filete de pescada ou um panado em fim de prazo, mais um copinho de vinho, e só um, que já não faltava quem abusasse dele. Do Menino...
Mas o desmentido não veio. O desmentido não vem. O Landinho morreu e é mais que tempo de eu dizer alguma coisa. Disse.
O Landinho. A maioria das pessoas não sabe, nas durante anos, todos os dias, ele jantava na minha casa. Era parte da família. Durante o dia, ajudava o "Filipe" a distribuir o gás, no fim da tarde vinha para nossa casa com o meu pai. Era uma festa tê-lo em casa.. O sonho dele, quiçá o único, era ser padre. Pegava num qualquer livro à mão e sempre vinha o "oh minó bispo, morreu o padre Franciscoooo...", usando aquete tom episcopal que a igreja usa. Não bebia álcool durante o jantar. Nunca. Saía de nossa casa feliz, isso eu, mesmo criança, sentia. Isto acontecia na rua José Cardoso Vieira de Castro. Depois ele sumiu e passei a encontrá-lo esporadicamente. Mas sempre, sempre ele me tratou com deferência, amizade, respeito. Eu guardo o Landinho daquele lado do peito.
ResponderEliminarLá em casa fomos beneficiários desse impecável serviço de entrega de gás que referes...
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