sexta-feira, 30 de junho de 2023

Adeus, confrade, até outro dia

Foto Expresso de Fafe
E agora, o que vai ser das nossas confrarias? Agora, quero dizer, agora que está tão próximo o dia infame da vitória de todos os veganismos e vegetarianismos, o que vai ser, repito, das nossas queridas confrarias. E penso muito especialmente, com o coração pesado e não sem um amargo de boca, na Confraria Gastronómica da Região de Lafões, na Confraria da Carne Barrosã, na Confraria Gastronómica da Raça Arouquesa, na Confraria Gastronómica do Toiro Bravo ou, puxando a brasa à minha sardinha, na Confraria da Vitela Assada à Moda de Fafe, honradas e orgulhosas confrarias que destaco ao acaso entre as cento e vinte e três mil novecentas e oitenta e sete confrarias gastronómicas de Portugal. E agora as confrarias? Agora que o consumo de carne está à beira de ser crime, o que vai ser daquelas fatiotas todas janotas? E dos pins? E das fitas? E das medalhas? E dos chapéus tão pândegos? E dos sarrafos? E das tainadas quinzenais? E das passeatas? E dos desfiles? E daquele sentimento de casta superior e há uns que são sempre os mesmos? E das viagenzinhas eventualmente de geminação, de preferência ao estrangeiro, sempre que possível ao Brasil, o que vai ser, agora?
Teremos sempre, graças a Deus, a Confraria de Nossa Senhora das Neves e a Confraria da Folha de Alface Repolhuda. Mas terão estes dois oásis digamos confreiráticos condições para acolher pelo menos com o conforto devido a uma galinha pedrês os milhões de confrades e confreiras assim de repente despejados dos seus deveres e haveres por esse país fora, como se fossem bandidos, refugiados praticamente?
Estou bastante preocupado.

Já agora. A lengalenga dos antigos em Fafe lengalengava-se assim como se segue, fazendo o sinal da cruz, Deus me perdoe: "Pelo sinal, bico real, comi toucinho no teu quintal, se mais me desses, mais eu comia, adeus, compadre, até outro dia."

P.S. - Mas enquanto há vida há esperança. Ou morra Marta mas morra farta. Leio no Expresso de Fafe, com alívio, que a nossa felizmente irredutível Confraria da Vitela Assada à Moda de Fafe celebra amanhã o seu VIII Capítulo. Eu não sei o que é que isso quer dizer, mas espero que não seja o último.

Para arejar...

Foto Hernâni Von Doellinger

quarta-feira, 28 de junho de 2023

Biblioteca de Fafe entra em horário de Verão

A Biblioteca Municipal de Fafe entra em horário de Verão já no próximo sábado, 1 de julho, dia em que estará fechada. Até 16 de Setembro, de acordo com informação do Município, a Biblioteca funcionará das 9 horas às 12h30 e das 14 horas às 17h30, de segunda a sexta-feira. Encerra aos sábados.

Difícil fotografar o silêncio

Foto Hernâni Von Doellinger

terça-feira, 27 de junho de 2023

Quando Marcelo deitava cartas e lia a sina

Sou fã de Marcelo Rebelo de Sousa, já disse. Embora fosse mais fã no tempo em que ele era "apenas" comentador. Gostava mais dele nessa altura. Gostava daquele ar cartomante com que o Professor nos revelava tudo aquilo que nós já sabíamos. Parecia O Astro mas sem turbante. Gostava daquele sorrisinho matreiro, sorrisinho marca já-te-fodi. Gostava da forma como o Professor ia à televisão vender pedaços de nada como se fossem o mundo inteiro. O truque estava no poder de concentração e nos embrulhos. Marcelo usava papel de embrulho do melhor: papel de lustro, manobrista e recadeiro. E os fregueses adoravam. Marcelo sabia mais que o Papa. Sabia mais que a Irmã Lúcia. Sabia o passado e o futuro. Marcelo era o nosso presente. E hoje é o nosso Presidente.
A omnisciência sempre me seduziu. Desde miúdo, quando, ainda em Fafe, eu ia a casa do Bertinho Dantas, meu rico menino, jogar O Sabichão. Depois, ao longo da vida, tive a sorte de encontrar sábios a sério em velhos lavradores, em professores, em camaradas de profissão, em três ou quatro amigos, gente que muito respeito e continuo a admirar. Hoje, porém, no negócio dos que tudo sabem, só me contento com Deus. Deus no Céu e Luís Marques Mendes na Terra.

Era uma vez 2005, ano de eleições legislativas em Portugal. Luís Filipe Menezes chefiava a lista do PSD por Braga e foi em pré-campanha a Celorico de Basto. O cabeça de cartaz do jantar-comício era Marcelo Rebelo de Sousa. O meu jornal mandou-me atrás dele. PSD à parte, eu sentia-me ali particularmente à vontade, era a minha zona, a bem dizer. Na ementa, lombo assado evidentemente.
Não sei se sabem, o lombo de porco assado, que por acaso é quase sempre apenas estufado, é a comida oficial da política em Portugal, e também é, regra geral, uma boa merda. Canja, lombo e musse de chocolate. Assim. Quem já passou por campanhas eleitorais e comeu todos os dias lombo, ao almoço e ao jantar, sabe muito bem do que é que eu estou a falar. Um suplício...
Mas adiante. Dos discursos, lembro-me apenas que Menezes "lançou" a candidatura de Marcelo à Presidência da República (as voltas que a vida dá!), oferecendo-lhe um quadro já não sei com que motivos. No final das intervenções, Marcelo andou de mesa em mesa, como noivo em dia de casamento, distribuindo bacalhauzada àquela gente toda a quem fazia questão de fazer de conta que conhecia cara a cara.
Eu aproveitei a confusão para dizer ao que ia:
- Sr. Professor, eu sou o...
- Eu sei - cortou simpaticamente Marcelo, estendendo-me a mão e um sorriso de orelha a orelha.
- ... o Hernâni Doellinger, do...
- Sei muito bem quem é - insistiu Marcelo, retirando a mão e reduzindo o sorriso.
- ... jornal 24horas - consegui informar, enfim.
- Exactamente, eu sei, sei muito bem, Hernâni, 24horas, eu sabia - concluiu Marcelo, metendo o resto de sorriso no bolso das calças e pedindo licença para continuar com os cumprimentos, que ainda havia muitas mesas para bacalhauzar no salão de cima e que falávamos no fim.
Claro que não falámos. Marcelo Rebelo de Sousa foi-se embora como quem não quer a coisa, fugiu sem me dar uma segunda oportunidade e se calhar até fez bem, o 24horas não se recomendava. Também não interessa. O importante é isto: o Professor não me conhecia de lado nenhum, nunca me tinha visto mais gordo nem mais magro, mas apareci-lhe à frente e ele "soube" logo quem eu era. Não é extraordinário? Agora que penso nisso, devia ter-lhe pedido que me lesse a sina. E que me desse os números do Euromilhões. 

Ainda hoje guardo religiosamente a mão com que cumprimentei Marcelo Rebelo de Sousa naquele encontro histórico de Celorico de Basto. Os nossos contactos seguintes, tal como os anteriores, resumiram-se ao telefone. Ligava eu, por dever de ofício. E o Professor atendeu-me quase sempre. E foi sempre amável e útil. Depois mudou-se para Belém, e nunca mais falámos...

E para terminar. Sobre O Astro - "Pensar, Professor, pensar..." -, quem tiver idade para se lembrar da telenovela de Janete Clair e do desempenho do actor Francisco Cuoco percebe a história do cartomante, quem for mais novo que se informe. E reparem: em 2005, portanto há dezoito anos, ainda as selfies em Portugal eram geralmente outra coisa, Luís Filipe Menezes também lia a sina, adivinhava a candidatura do Professor, exactamente em Celorico, mas não era assim tão difícil. Marcelo, estava-lhe nas linhas das mãos, trabalhava no assunto desde que nasceu. Com efeito, Marcelo Rebelo de Sousa é Presidente da República desde pequeninho. Pequeninho, que é como se diz pequenino lá para os nossos lados galegos de Fafe e Basto. Ou pequerricho. Como o nosso Luisinho, que, hão-de ver, também é homem para chegar lá.

Entre as brumas da memória

Foto Hernâni Von Doellinger

Bruxedos e outros medos

Durante uma semana, um alguidar contendo um enorme galo sem cabeça e outras miudezas feiticeiras esteve em exposição no passeio junto ao por...