Foto Hernâni Von Doellinger |
Em todo o caso, fui semanticamente injusto quando chamei sapateiro ao meu avô da Bomba. Sapateiro. Nestes tempos em que nem os cegos são cegos - são invisuais -, agora que já nem há mentirosos - mas inverdadeiros -, nos dias em que nem os bois são chamados pelos nomes - têm números -, chamar sapateiro ao meu avô da Bomba é praticamente um insulto, e estou muito arrependido, que me desculpem os sapateiros propriamente ditos.
Se escrevesse hoje, e é o que faço agora, eu diria que o meu avô da Bomba era um mestre do artesanato, um artífice do calfe, uma sumidade da sovela, uma Joana Vasconcelos por antecipação, e fazia-lhe um museu; diria que era uma start-up em pessoa e metia-o na Bolsa de Nova Iorque; diria que era um criador de sapatos e enchia-o de massa do PRR; diria que era um caso exemplar do empreendedorismo nacional e pendurava-lhe mais uma medalha no 10 de Junho; diria que era um estilista, um designer de calçado, e acompanhava-o à Feira de Milão. É isso. Se escrevesse hoje, eu diria que, para todos os efeitos, o meu avô era um artista. Era, era...
P.S. - Hoje é Dia de São Simeão Estilista, o Antigo.
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